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Mark Kosower ? Ao ensinar a outra pessoa, você também ensina a si mesmo

11 de setembro de 2009

Mark Kosower, um dos violoncelistas de maior destaque de sua geração, que recentemente foi convidado a assumir o posto de primeiro violoncelo da Orquestra de Cleveland, realizou master class com alunos da Tom Jobim – EMESP no dia 18 de agosto no auditório da unidade Luz. No mesmo local, no dia anterior, o violoncelista interpretou obras de Johann Sebastian Bach, Zoltán Kodály e György Ligeti em um concerto para cerca de 100 pessoas. Em entrevista ao site da EMESP, Kosower falou sobre sua relação com o Brasil, de como foi a master class, do repertório escrito para violoncelo e de como o músico deve estar sempre em constante desenvolvimento.

15/09: Master Class com Antonio Meneses

Essa é a sua primeira vez no Brasil?

Vim ao Brasil pela primeira vez em 2003, para dar algumas aulas, fazer um recital no Rio de Janeiro e tocar ao lado da Orquestra Sinfônica Brasileira. Desde então, voltei ao País para apresentações solo e ao lado da Orquestra Sinfônica de Bamberg (Alemanha), para locais como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Portanto, você gosta de voltar ao Brasil?

Gosto bastante do Brasil. É um País muito rico em sua diversidade, tanto em termos de paisagem como de seus habitantes. Possui uma atmosfera positiva que me atrai e faz com que eu me sinta bem por estar aqui.

Você possui afinidade também com a música brasileira?

Sempre fiquei muito intrigado com a música tradicional brasileira, sua complexidade, diversos ritmos, sua vivacidade e espírito. Isso é algo que acho muito atraente. Em minha primeira noite no Brasil, no Rio de Janeiro em 2003, acompanhei uma apresentação musical noturna com sambas e canções antigas que me agradou muito. As interpretações traziam tanta beleza que fui cativado pela magia deste momento especial.

Poderia citar algum compositor brasileiro de sua preferência?

É claro que Villa-Lobos é o mais famoso, historicamente, dos compositores brasileiros. Gosto muito de sua música, especialmente da série das Bachianas Brasileiras. Por ele ter sido violoncelista, é natural para mim apreciar a sua música.

Como foi a sua master class na Tom Jobim – EMESP?

Encontrei aqui estudantes muito atentos e com bastante vontade de aprender. Os músicos que ouvi são talentosos. Espero que eles tenham apreendido as informações que tentei passar e que eles consigam absorver as novas ideias e perspectivas trabalhadas para o futuro.

Qual o nível dos alunos que participaram da master class?

O nível foi muito bom. O que tento passar em minhas aulas é que cada músico deve sempre buscar o próximo nível, a próxima etapa em seu desenvolvimento pessoal. Dei algumas dicas para os alunos com a intenção de ajudá-los em sua progreção.

Qual a diferença entre ensinar para iniciantes e estudantes de níveis avançados?

Para mim o importante não é tanto o nível no qual o estudante se encontra, porque sempre procuro recorrer à base, aos fundamentos. Isso se aplica também ao meu trabalho como interprete, pois acredito que sem uma base forte não é possível alcançar os níveis mais altos. Novamente, creio que em termos pedagógicos o segredo é buscar o próximo passo para cada indivíduo, e para que isso seja possível, é necessário ao professor ter experiência para conhecer os estudantes, para poder lidar com diferentes personalidades e tipos de instrumentistas. Sinto que a cada dia me aproximo mais deste ponto, mas acredito que nunca paramos de aprender, e adquirimos experiência continuamente ao longo da vida.

Você também aprende ao ensinar…

Ao ensinar a outra pessoa você também está ensinando a si mesmo, se ajudando. Ao observar e escutar outros músicos, você adquire novas ideias. Diria que essa é a beleza de se ensinar. Talvez em situações como essas, de master classes, o prazer seja ainda maior porque você consegue a atenção incondicional dos alunos, porque você é uma pessoa nova, que não está presente em seu dia-a-dia como os seus professores regulares. Por isso considero importante para todas as Escolas que recebam professores de fora, para fortalecer a instituição e reforçar aquilo que é ensinado diariamente nas salas de aula.

Você foi professor nos Estados Unidos?

Dei aulas de violoncelo e música de câmara durante dois anos no Conservatório de Música de São Francisco.

Existe uma grande diferença em ser professor de uma instituição e dar master classes?

É diferente porque em uma instituição você pode conhecer pessoalmente cada estudante e criar uma relação de trabalho com eles. Em relação às master classes, tem uma dimensão diferente e é gratificante de outras formas, porque você constrói uma relação de longo termo. Para mim, dar master classes em vários países é fascinante porque posso ver o que está acontecendo mundo afora e ter contato com formas de ensino e pensamentos distintos.

O repertório para violoncelo é extenso ou restrito a poucos compositores?

Historicamente, até o final do século XIX, havia muito menos obras escritas para violoncelo solo do que para violino ou para piano. Isso pode ser explicado em parte porque o nível dos instrumentistas de violoncelo era menor do que o dos pianistas e violinistas. No Século XX, no entanto, esse panorama mudou e muitas obras foram compostas para violoncelo nos últimos 100 anos. Atualmente existe um vasto repertório para o instrumento, que, como dizia um professor meu, se não é enorme, é ao menos suficiente para toda uma vida.

Para a interpretação do repertório barroco, ou de música antiga, você considera importante que sejam usados instrumentos antigos, ou que seja preparada uma atmosfera especial que remeta aos séculos passados?

O que posso dizer a respeito desse assunto é que quanto mais você conhece a história dos autores e do repertório, melhor você pode se desenvolver como músico. Partindo desse raciocínio, creio ser válido você saber, pela análise de partituras e documentos recuperados do passado, como era o pensamento nessa época, como eles lidavam com os equipamentos e como tocavam os instrumentos. Mas, a parte disso, acredito que seja uma questão do que você quer retratar para a sua plateia. Me pergunto: – Queremos tocar a música como ela é vista atualmente, no ano de 2009, ou queremos tocá-la da maneira que imaginamos que ela era tocada há 200 anos? Não estou dizendo que não haja sentido em se fazer assim. Alguns músicos da atualidade tocam música antiga em equipamentos modernos, o que também pode ser feito, mas, a mim, parece um pouco estranho, porque se você quer tocar no estilo antigo, você deveria utilizar o equipamento antigo, devido às sonoridades que ele produz. No mais, trata-se de uma evolução. A forma de tocar mudou porque o equipamento mudou e os novos instrumentos produzem novas sonoridades.

Segundo você o nível dos violoncelistas não era tão alto como dos pianistas e violinistas no século XIX. Dessa época para cá, grandes violoncelistas surgiram. Você poderia citar alguns?

Existe um grande número de músicos top atualmente, talvez mais do que em qualquer outra época. Artistas como Truls Mork, Gary Hoffman, meu antigo professor, Janos Starker, apesar de ele não se apresentar mais, Ralph Kirshbaum, David Geringas, são todos grandes violoncelistas. Mas agora, temos as pessoas de minha idade, que formam a nova geração. Admiro o trabalho de muitos de meus colegas e aprecio bastante as suas interpretações.

Você teria algum conselho a deixar para os jovens músicos?

Sem querer parecer trivial, acho que eles devem seguir os seus instintos. O que quero dizer com isso é que, como estudante, você deve estar aberto a experimentações e ser capaz de fazer tudo o que o seu professor lhe propõe. Mas, no fim, trata-se mesmo de seguir os seus instintos. Aquilo que te toca, que faz você vibrar e aquilo que você sente ser o correto para você como instrumentista, tecnicamente, musicalmente e ao longo de seu desenvolvimento como músico. Ao mesmo tempo, com o amadurecimento, ao decidir que tipo de músico você quer ser, o importante é permanecer aberto a novas experiências. Fechar a porta é dizer: – esse sou eu e não há nada mais a se fazer. É importante aprender durante a sua vida toda, e isso não deve parar no momento em que você sai da escola. Os maiores instrumentistas de cordas, ou piano, continuaram o seu desenvolvimento até o final da vida. Um exemplo do que estou falando é Nathan Milstein que, como músico, tornou-se sempre melhor e melhor ao logo da vida. Pelo que sei, muitos de seus melhores trabalhos datam de seus 80 anos, o que é quase inimaginável para um instrumentista de cordas. Todos sabem que ao atingir essa idade as coisas não funcionam tão bem. Outros artistas, como Rubinstein, também foram magníficos na maturidade. Para mim, é incrivelmente inspirador saber disso.

Na master class você disse que é preciso haver uma conexão entre músico e instrumento…

A música precisa tocá-lo. Todos nascem com uma relação diferente com os instrumentos, mas creio ser um trabalho conjunto do professor com o aluno de encontrar essa conexão. Dessa forma, eles estarão verdadeiramente conversando, dançando e cantando com o instrumento. Porque, ao menos que haja essa conexão, eles podem aprender a tocar em um alto nível, profissionalmente, mas, no fim, o que produzirem não irá significar muito. Então, no meu modo de pensar, o importante é encontrar a sua própria ressonância com a música. O instrumento ressoa quando você toca, mas você também precisa ressoar. O instrumento não irá ressoar verdadeiramente a não ser que você também o faça. Por isso, nesta master class falamos sobre respiração, formas de se realizar os movimentos, e tudo se conecta a isso, que é o ponto principal para mim. Dar aos estudantes os equipamentos, conhecimentos, técnicas e meios para que eles possam se expressar com a maior eficácia e sensibilidade.

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