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Franceses pintam sonoridades com alunos do Guri

06 de maio de 2013

Pelo segundo ano, músicos do Conservatório de Paris realizaram oficinas que estimularam o lado criativo e a imaginação dos participantes

Quem chegasse desavisado no Teatro do CEU Perus na tarde do sábado, 16 de março, provavelmente não entenderia muito bem o que estava acontecendo. Seria música, teatro, dança ou apenas uma brincadeira? Nada disso exatamente. Tratava-se da apresentação de encerramento de um ciclo de intercâmbios onde alunos do Guri  aprenderam, com músicos do Conservatório de Paris, um pouco de uma técnica chamada Soundpainting.

“Foi uma noite em que pudemos, todos, acessar a uma mesma linguagem, que é universal”, diz um dos franceses, Dylan Corlay, especialista na prática que foi criada na década de 1970 pelo compositor nova-iorquino Walter Thompson. Por meio de um conjunto de 1.200 sinais – todos criados a partir de experiências artísticas -, o propósito é estimular a improvisação coletiva e a sensibilização musical.

No palco, o que se via eram músicos elaborando sonoridades bastante distintas das tradicionais. As peças musicais não obedeciam a uma linearidade, eram interrompidas por solos repentinamente e mudavam de ritmo frequentemente. Tudo sob comando de um regente – o soundpainter – que liderava utilizando gestos incomuns para o público leigo, o que muitas vezes provocava risos na plateia, num clima de interação e descontração.

A apresentação foi fruto de um trabalho desenvolvido por duas semanas com alunos do Guri – dos cursos seqüenciais dos polos CEU Perus e Inácio Monteiro e dos Grupos Infantis e Juvenis. Por meio de oficinas, os jovens músicos foram estimulados a aprimorar técnicas de improvisação e de técnica estendida, que formam uma base para integrar o soundpainting. “É uma aproximação interessante com a música pois tiramos a partitura da frente deles”, explica Corlay. Ele se surpreendeu com a aceitação do grupo. “As crianças não têm um tabu em experimentar as técnicas propostas. É tudo muito espontâneo com eles”, conta.

Todos os alunos entrevistados comentaram a respeito da quebra de padrões proporcionada durante a experiência com os franceses. O menino Daniel da Conceição, 13, estudante de violino do CEU Perus, foi taxativo: “foi inesperado, mexeu muito com a nossa cabeça”. Ele disse que as técnicas “estimularam o lado da imaginação e da criação, que nas aulas normais não mexemos”. A colega Juliana Nascimento, 14, achou interessante a possibilidade de trabalhar com composição. “Foi uma grande novidade para mim”, disse, acreditando que o exercício pode ajudá-la a desenvolver-se no aprendizado musical.

A integrante do Coral Infanto-Juvenil do Guri Vanessa Almeida, 18, teve a experiência de ser uma soundpainter em uma das peças do concerto final.  “O mais difícil foi vencer o medo de experimentar algo novo. Mas essa adrenalina de enfrentar o medo e saber que foi possível fazer o que foi proposto é gratificante”, relata. Para Fernanda Tardivo, 17, participar do intercâmbio foi “um modo de quebrar conceitos que definem o que é música”. O que mais marcou a jovem violinista foi a percepção de que é possível exercer liberdade artística. “Somos livres para criar o que quisermos”, afirma.

No total, mais de uma centena de alunos do Guri participaram do intercâmbio, além de alguns professores, que também receberam oficinas. A coordenadora pedagógica da Santa Marcelina Cultura, Valéria Zeidan, responsável por acompanhar a visita dos músicos do Conservatório de Paris ao Programa, acredita se tratar de “uma outra possibilidade de organização sonora em que o resultado é sempre o improviso”. Foi o segundo ano que o prestigiado centro de ensino musical enviou representantes para trabalhos com a Santa Marcelina Cultura.

“Meu verdadeiro desejo é que esse projeto e a energia que ele gerou continue acontecendo, mesmo depois de irmos embora. A intenção era apresentar algo novo aos professores e alunos. Uma porta foi aberta, agora espero que continuem nessa direção”, finaliza o francês Dylan Corlay.

 

“Não há barreiras no Soundpainting”

Confira trechos da entrevista com Dylan Corlay, músico do Conservatório de Paris e especialista na técnica de Soundpainting, realizada no auditório Zequinha de Abreu, na EMESP, dois dias antes do concerto no CEU Perus.

Como surgiu o seu interesse por essa técnica inovadora?
Venho estudando o Soundpainting há cinco anos depois de ter criado (durante a universidade) um espetáculo multidisciplinar em que pretendia unir diferentes tipos de arte. Descobri essa linguagem na Internet através de amigos e então decidi fazer uma formação com o Walther Thompson (criador do método). Foi algo que me impulsionou a me descobrir pessoal e profissionalmente.
 

Quais são as competências desenvolvidas em oficinas como essas?
Desenvolvemos, sobretudo, o imaginário sobre o instantâneo, assim como a improvisação. De uma forma que possamos ficar menos aprisionados com a partitura, por assim dizer. Colocamos os alunos diante de nós sem partitura e pedimos que eles nos dêem as ideias deles. É uma possibilidade de se descobrir como músico ou como artista em geral, mas também como soundpainter, ou seja, de entender um pouco mais as diferentes facetas enquanto músicos, seja em performance ou na figura do maestro. O soundpainter tem o papel de escutar e organizar todos os sons.

Que referências ou características o público deve possuir para extrair compreender a proposta? Como você imagina que esse público reagirá ao espetáculo?
Com relação à primeira questão, penso que o público que chega a uma sala sem conhecer o soundpainting vai achar um pouco estranho. Às vezes alguns maestros explicam o que está acontecendo. Mesmo pessoas que vão assistir a concertos de música clássica se perguntam: (aspas)o que faz esse maestro aí na frente´. Há espectadores que querem entender tudo, mas no soundpainting não é possível entender tudo. Por outro lado, o soundpainting é uma linguagem universal. E com o público brasileiro, senti uma forte energia de curiosidade. Isso é bom, porque quando vamos a um espetáculo de arte esperamos ser surpreendidos. O soundpainting não tem barreiras, tudo é permitido.

Alguma consideração final?
Estou com um pouco de medo do concerto de sábado porque haverá muita gente reunida em torno do soundpainting. Nos encontraremos numa noite em que poderemos acessar a mesma linguagem. Meu desejo é que esse projeto continue acontecendo.

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