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Haydn e Beethoven – Elegância e Impetuosidade, Razão e Emoção

30 de agosto de 2017

Nos dias 8 e 10 de setembro, a Orquestra Jovem do Estado se apresenta no Teatro Municipal Erótides de Campos, em Piracicaba, e na Sala São Paulo. Os concertos têm como solista a violoncelista francesa Ophélie Gaillard, e a regência é do maestro convidado Luis Otavio Santos, coordenador da área de música antiga da EMESP Tom Jobim. O repertório traz uma abordagem historicamente informada de peças-chave de Haydn e Beethoven. No texto abaixo, Hermes Jacchieri, professor da EMESP Tom Jobim, comenta uma a uma as obras do programa.

Haydn e Beethoven – Elegância e Impetuosidade, Razão e Emoção
Por Hermes Jacchieri

Abertura Coriolano (Ludwig Van Beethoven)
O jurista e poeta Heinrich Joseph von Collin, hoje completamente esquecido, foi autor de uma peça intitulada Coriolano, baseada na tragédia de Shakespeare de mesmo nome e que teve bastante notoriedade na época. A peça não estava mais em cartaz, mas uma representação foi feita em 1807 no palácio do príncipe Franz Joseph von Lobkowitz, amigo e patrono, para a apresentação da obra de Beethoven.

Gaius Marcius Coriolano – Caio Marcio, em português – é o personagem heroico da peça, e Beethoven faz aqui uma obra de caráter fortemente descritivo, com temas que desenham a psicologia dos personagens e o desenvolvimento da ação dramática.

A peça narra a saga heroica do general revoltado que, apoiado por seu exército, pretende invadir Roma contra o Senado; mas mulheres romanas, lideradas por sua mãe e sua esposa, vão até ele e pedem que desista e poupe a cidade. Coriolano entra num dilema: atender ao pedido das mulheres ou satisfazer à ira de seus correligionários. Não podendo se decidir, opta pelo suicídio.

Beethoven escreveu quatro aberturas para sua ópera Fidélio (as chamadas Aberturas Leonora), além das aberturas Egmont e Coriolano. Esse conjunto de obras é considerado pelos estudiosos do desenvolvimento da linguagem musical como a base da música dita programática, representada pelos compositores que posteriormente se dedicaram a escrever o gênero conhecido poema sinfônico, como Berlioz, Liszt e Strauss.

Concerto para violoncelo nº 2 (Joseph Haydn)
Cento e sete sinfonias, 16 aberturas, 47 divertimentos para instrumentos variados, 83 quartetos de cordas, 11 trios sonatas, 21 trios de cordas, 17 concertos para instrumentos solistas e orquestra, 37 danças, 151 duos e trios com baryton (antigo instrumento grave de cordas), 43 trios e divertimentos com piano, 52 sonatas para teclado (piano, cravo ou clavicordio),11 concertos para teclado e orquestra, 32 peças para relógio mecânico (órgão), 43 obras sacras, 34 cantatas e árias com orquestra, 14 óperas, 5 músicas incidentais para peças de teatro, 273 canções para voz, teclado e instrumentos, e mais de 50 obras perdidas.

Esse é resumo do impressionante catálogo de obras de Joseph Haydn.

Se fosse feita uma lista dos dez compositores mais influentes da história da música responsáveis pelo avanço e renovação da estética da linguagem musical, Joseph Haydn estaria tranquilamente entre eles. Sua influência foi sentida ainda durante sua vida, é considerado o pai da sinfonia clássica e do quarteto de cordas, além de ter escrito muitas sonatas para piano, trios, divertimentos e missas, que se tornaram a base do estilo clássico de composição de música erudita.

O desenvolvimento da forma-sonata de um esquema rígido em uma maneira sutil e flexível de expressão musical, que se tornou dominante no pensamento musical clássico, é devido quase que completamente a ele, além da forma de variação dupla, e da integração da fuga e outros modelos contrapontísticos à forma clássica.

Além do extraordinário talento e capacidade criativa, Haydn teve a seu favor sua própria personalidade: foi uma pessoa positiva, bem humorada e equilibrada, que soube administrar a própria carreira. Trabalhou durante quase trinta anos para a família Eszterházy, umas das mais importantes e influentes dinastias do império austríaco.

Nesses anos, negociou com príncipes a possibilidade de viajar difundindo a sua obra fora da Áustria, esteve em Paris a convite da rainha Maria Antonieta, austríaca de nascimento. Em 1790, com uma generosa pensão assegurada pela família Eszterházy, foi para Londres, onde fez enorme sucesso. Foi convidado para permanecer na Inglaterra, mas recusou a proposta e voltou para a Áustria e, para surpresa dos que o consideravam velho demais, escreveu umas das principais obras sacras de todo o repertório, o oratório A Criação (1797), além de As Estações, do Te Deum, e dos nove últimos quartetos de cordas.

Foi amigo intimo de Mozart, de quem deu testemunho público de sua admiração, foi também um dos primeiros a reconhecer a genialidade de Beethoven, que o procurou para ter aulas de composição.

Apesar do imenso catálogo de obras, Haydn deixou um número reduzido de concertos para instrumento solista e orquestra (alguns se perderam, como o de contrabaixo e o de trompa). Todos os concertos que sobraram são obras importantes para os instrumentos para os quais foram escritos, como, por exemplo os de violino, o de piano, o de trompete, e os dois de violoncelo.

Haydn escreveu quatro concertos para violoncelo, mas dois se perderam. Os dois restantes são repertório obrigatório para todos violoncelista. O Segundo Concerto foi escrito em 1783, para Antonin Kraft, excelente violoncelista da orquestra do príncipe Esterházy.

Sinfonia nº 7 (Ludwig Van Beethoven)
Friedrich Wieck – pai de Clara Schumann – ao assistir ao primeiro ensaio da Sétima Sinfonia de Beethoven a considerou “pobre em melodias”, Romain Rolland a considerou uma “orgia de ritmos”, e Richard Wagner se referiu a ela como “a apoteose da dança”.

Todos têm razão, porém Friedrich Wieck não desenvolveu nenhum raciocínio sobre o fato de a obra de Beethoven não apresentar a mesma franqueza melódica de Mozart ou Schubert, ambos exímios compositores de musica vocal e com forte apelo melódico.

O material sonoro em Beethoven adquire, com o desenvolvimento da sua linguagem, uma importância que vai além da construção melódica. Os timbres, texturas, ritmos, intensidades e densidades sonoras assumem um papel tão importante no discurso beethoviniano que o material francamente melódico causa até alguma surpresa quando se manifesta.

Forma, estrutura, rítmica, arquitetura musical são os grandes legados de Beethoven para a música que veio após ele. Sua obra mostrou uma força inovadora que impulsionou o discurso musical para muito além dos parâmetros estéticos praticados até então.

A Sétima Sinfonia foi estreada em 1813 juntamente com A Vitória de Wellington, num concerto beneficente em prol dos soldados que lutavam contra o avanço das tropas de Napoleão Bonaparte. O sucesso dessa estreia beneficiou muito a carreira do já então célebre compositor. Por celebrarem as vitórias contra Napoleão, as duas obras foram durante muito tempo executadas em conjunto.

O início da sinfonia é um trabalho que exemplifica o novo pensamento de Beethoven. Os materiais sonoros vão sendo mostrados sem nenhuma explicitação claramente melódica, uma ideia vai se construindo, calmamente e com extrema clareza até que finalmente uma melodia potente e fortemente calcada na rítmica surge.

No conjunto dessa obra tão inovadora é possível concordar e desfrutar da “orgia de ritmos” de Roland e da “apoteose da dança” de Wagner.

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