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Arquivo de novembro de 2017

Música para uma ópera, um balé e uma pessoa

Postado por marina em 29/nov/2017 -

A Orquestra Jovem do Estado encerra a temporada 2017 na Sala São Paulo, no dia 17 de dezembro, às 16h. Sob regência de Claudio Cruz, o grupo vai interpretar obras de Wolfgang Amadeus Mozart, Igor Stravinsky e Carl Nielsen, com a participação do clarinetista Bruno Ghirardi – vendedor do prêmio Jovem Solista 2017. Na ocasião, será realizada a cerimônia de entrega do 6º Prêmio Ernani de Almeida Machado. Ingressos a R$40 (inteira) e R$20 (meia-entrada) – vendas no site da Ingresso Rápido.

Com o mesmo programa, a Orquestra Jovem tmabém se apresenta no Teatro Procópio Ferreira do Conservatório de Tatuí, em Tatuí/SP, no dia 16 de dezembro, às 16h. Leia abaixo os comentários do professor da EMESP Tom Jobim, Hermes Jacchieri, sobre o repertório.

Música para uma ópera, um balé e uma pessoa
Por Hermes Jacchieri

Carl August Nielsen (1865-1931), Concerto para Clarinete

Atualmente considerado o principal compositor da Dinamarca, Carl August Nilsen teve um reconhecimento internacional tardio. A partir de 1960, Leonard Bernstein passou a incluir a sua obra sinfônica em seus concertos, consolidando a fama de Nilsen. Gravou a Sinfonia nº 3 e, em 1967, o Concerto para Clarinete, com o solista Stanley Drucker. Benny Goodman tambem gravou o concerto nesse mesmo ano.

Internacionalmente, as obras mais divulgadas de Nilsen são suas seis sinfonias, seu quinteto de sopros e os concertos para flauta, violino e clarinete, além de importantes obras corais.

Não é raro que um compositor escreva uma obra solo para um determinado instrumentista, esse foi o caso desse concerto. Em 1921, Nielsen ouviu um ensaio do Quinteto de Sopros de Copenhagem, e ficou encantado com a sonoridade do grupo – e assim uma amizade nasceu. Nesse mesmo ano, Nilsen escreveu para o grupo seu famoso Quinteto para Sopros, o último movimento é um presente para cada integrante do grupo, um tema e variações onde a personalidade de cada intérprete está representada numa variação escrita para seu instrumento.

Nilsen planejava escrever um concerto para cada um de seus cinco amigos, mas apenas dois foram escritos; para Gilbert Jespersen escreveu, em 1926, o Concerto para flauta, e, em 1928, o Concerto para clarineta para seu amigo Aage Oxenvad.

Com o mesmo espírito das variações do quinteto de sopros, Nilsen quis representar a personalidade bipolar de seu amigo e suas próprias angústias. Composto aos 63 anos, quando Nilsen estava decepcionado pela falta de aceitação de sua obra fora da Escandinávia, preocupado com a instabilidade social e política da Europa.

Alterações de humor são sentidas a todo momento, além da constante “briga” entre as tonalidades fá e mi maior. É notável a participação também solista da percussão.

Após a estreia, um crítico escreveu: “Eele liberou a alma do clarinete, não apenas o aspecto animal selvagem, mas também sua marca especial de poesia implacável… Este trabalho dificilmente poderia ter encontrado uma interpretação mais homogênea. A sonoridade de Oxenvad está em sintonia com os trolls e os gigantes, e ele tem alma, uma força primordial áspera e pesada, misturada com a ingênua suavidade dinamarquesa.”

Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), abertura de Don Giovanni

Mozart estreou a sua primeira ópera em 1767, compôs 22 (das quais três incompletas), sendo a última A Flauta Mágica, composta no ano de sua morte. O maior espaço de tempo entre duas óperas é de apenas 3 anos, justamente entre Don Giovanni, de 1787, e Così Fan Tutte, de 1790.

Levando em consideração que uma ópera tem em média 3 horas, enquanto uma sinfonia clássica tem entre 15 e 20 minutos, todas as 41 sinfonias de Mozart equivalem aproximadamente às suas cinco últimas óperas. Essa comparação é para dar uma ideia do empenho criativo de Mozart em suas óperas.

Durante sua breve vida, Mozart obteve sucesso com suas óperas, a despeito de sua constante luta para conquistar seu sustento, e só obteve um emprego fixo em 1787 – mesmo assim, com um salário baixo. Dessa forma, o lucro de suas óperas representavam uma parte importante de seus rendimentos.

Atualmente, nós ouvimos a produção dos compositores das épocas passadas inúmeras e incansáveis vezes, com intérpretes diferentes, em gravações, ao vivo, comparamos as interpretações, colecionamos gravações. O público dessas épocas, ao contrário, queria novidade, e as músicas “envelheciam” muito rapidamente, de maneira que o compositor precisava renovar constantemente seus repertórios para poder viver. A quantidade de récitas de uma ópera dependia diretamente de sua aceitação pelo público e, se fosse bem recebida, poderia ser encenada em várias cidades. Mas em pouco tempo a novidade se esgotava e um novo espetáculo deveria ser posto no lugar, mais ou menos como um filme no cinema nos dias de hoje.

A ópera trata da vida aventureira de Don Giovanni (baseado no personagem Don Juan) e de suas incontáveis conquistas amorosas – o lado trágico do libreto fala sobre a morte em duelo do pai de uma de suas amantes, que no final da história volta como um espírito que acaba por levar Don Giovanni para o inferno.

Toda ópera deveria ter uma abertura sinfônica. Don Giovanni é considerada pelo próprio Mozart como um dramma giocoso. Logo, a sua abertura, composta na noite anterior à estreia, contém os elementos de drama e comédia que estão presentes na ópera.

Igor Stravinsky (1882-1971), Petrushka

A composição dos balés O pássaro de fogo, Petrushka e A Sagração da Primavera, todos de Stravinsky, foi fruto de sua participação nos Ballets Russes, companhia de balé emigrada da Rússia, com sede em Paris. A companhia foi fundada por Sergei Diaghilev (1872-1929) e se manteve em atividade de 1909 a 1929, tendo influenciado todas as formas de balé contemporâneo. Os melhores coreógrafos, dançarinos, cenógrafos e designers da época trabalharam nela. Diaghilev contratou artistas como Stravinsky, Pablo Picasso, Henri Matisse, Jean Cocteau, Anna Pavlova, Tamara Karsavina, George Balanchine e o mítico bailarino Vaslav Nijinski.

Os Ballets Russes redefiniram, durante seus 20 anos de existências, o conceito de balé.

Petrushka foi o segundo espetáculo composto por Stravinsky para a companhia, estreando em junho de 1911.

Numa feira, um mágico dá vida a três bonecos: uma bailarina, o boneco que é Petrushka, e o Mouro; eles começam a dançar. Petrushka se apaixona pela bailarina, mas não é correspondido, ele se sente infeliz, uma alma aprisionada num corpo de boneco. Ele acaba brigando com o boneco do Mouro e é morto, as pessoas na feira ficam horrorizadas, mas o mágico mostra que é apenas um boneco de pano, todos vão saindo indiferentes e o mágico volta para casa arrastando o boneco. Mas, de repente, ouve um lamento, e acima de uma tenda aparece o fantasma de Petrushka. O mágico foge apavorado e a figura de Petrushka cai inanimada.

Na peça, apenas os bonecos demonstram sentimentos e personalidade, enquanto as pessoas agem de maneira mecânica, automatizada.

Stravinsky utiliza vários temas folclóricos russos, a orquestração difere muito de seu balé anterior O Pássaro de Fogo, que ainda é mais nos padrões de seu professor Rimsky-Korsakov. Em Petrushka a elaboração rítmica, a orquestração, o tratamento harmônico fizeram com que Taruskin, o estudioso da obra de Stravinsky, afirmasse que com esse balé “Stravinsky finalmente se tornou Stravinsky”.

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